Amantes de livros na era digital
- Isys Bastos
- 31 de out. de 2017
- 5 min de leitura

Foto: Isys Bastos
Desde 2004, ano em que surgiu o termo Web 2.0, a sociedade passou a ver a internet e os meios eletrônicos de forma diferente. Isso porque esse conceito se refere ao modo como os conteúdos online passaram a ser utilizados pelas pessoas, não apenas como algo estático e rígido, como anteriormente, mas pelo contrário, uma plataforma dinâmica na qual todos os usuários podem criar seu próprio conteúdo, colaborar com os projetos de outras pessoas e, principalmente, permitir a interação entre indivíduos e grupos que compartilham dos mesmos interesses.
Atualmente, com o grande avanço da tecnologia e o surgimento de novas unidades de medida tecnológica como o terabyte e também de dinheiro digital ou criptomoeda, denominada bitcoin, já se fala inclusive na Web 3.0. O termo foi apontado pelo jornalista John Markoff, do "New York Times", e representaria essa evolução ainda maior pela qual a internet vem passando, também podendo ser chamada de Web Inteligente.
Pensando nas mudanças trazidas pela Web 2.0, os últimos anos representaram muitas novidades para quem é amante da literatura, por exemplo. Certamente podemos dizer que o impacto da tecnologia atinge diversas outras áreas das mais variadas formas, mas ao observar como os leitores se adaptaram, temos uma demonstração sucinta e clara de tudo que adquirimos nessa geração.
Falar sobre leitura e internet implica muitas outras questões, como direitos autorais, reprodução em massa e até mesmo essa forma maleável que os textos tomaram na internet, passando de um site a outro e sendo baixado por várias pessoas. Mas o curioso é que, ainda com as inovações, os amantes de livros – sejam eles físicos ou digitais – seguem firmes, se adaptando a elas, cada um à sua maneira.
“Desde que comprei meu leitor digital eu tenho lido mais livros em e-book,” conta a jornalista Lívia Saenz, 24 anos. “Percebi que a leitura fica mais rápida." Fatores relacionados à rotina da população ativa de nossa sociedade sem dúvidas contribuem para essa modernização dos livros, sendo o principal deles a falta de tempo. Afinal, para quem precisa ter livros sempre à mão, um aparelho que permite carregar diversos títulos, sem ocupar espaço e peso, é muito mais vantajoso quando se vive fora de casa.

Por outro lado, muitas vezes a tecnologia acaba atrapalhando, e alguns leitores ainda preferem o livro tradicional e os rituais que o acompanham. “Confesso que tenho dificuldade em fazer leitura de livros digitais, pois me desconcentro com grande facilidade”, comenta a graduanda em língua portuguesa e suas literaturas Natália de Oliveira Gomes, 21 anos. “Sou muito mais adepta aos livros físicos, porque tenho aquela paixão em ter o material em mãos e na estante de casa.” Ela acrescenta que, no curso superior, alguns professores mais conservadores ainda exigem a obra física, mas que a praticidade e economia em um momento ou outro acabam fazendo com que os aparelhos eletrônicos sejam adotados. “Eles tornam mais rápidas as buscas através do texto, o que ajuda na hora de direcionar uma pesquisa, ou encontrar um trecho que você já leu”, completa a também graduanda em letras Marilene Sipriano.
Foto: Natália Gomez / Foto Matheus
Plataformas que movimentam o interesse
Além das novas formas de ler, a internet possibilita a cada dia mais a interação e discussão sobre o que é lançado, o que é mais procurado, entre outros temas do mundo literário. Comunidades em plataformas gratuitas como o Wattpad têm ganhado cada vez mais cadastros e publicações. O Wattpad, por exemplo, é uma extensa comunidade de leitores e escritores de vários países, mas nem sempre foi assim. Apesar de ter sido criado em 2006, só começou a se popularizar por volta de 2010, e em 2013 já contava com mais de 20 milhões de usuários.
O site contém obras de domínio público de autores famosos e iniciantes. Assim, além de ter livros clássicos em seu smartphone, você também pode publicar sua própria história, de onde estiver. É possível fazer comentários nas postagens, como em uma rede social, e assim os internautas trocam opiniões sobre a obra, e o próprio autor pode participar deste debate. As editoras ficam atentas aos números de leituras, à procura de novos talentos. Um exemplo é a escritora americana Anna Todd, que, após ter sua trilogia "After" com mais de 1 bilhão de acessos, teve a história publicada e ainda adaptada para o cinema. Um exemplo parecido e também muito famoso é o da autora E.L. James, que começou escrevendo sua história baseada na série "Crepúsculo", de Stephenie Meyer, no site americano FanFiction.Net e devido ao grande sucesso, o enredo e personagens foram modificados e adaptados para se tornarem os três livros que compõe a trilogia "Cinquenta tons de cinza".
Outro crescimento que podemos observar são dos blogs literários. Além dos blogs de editoras consagradas, estes sites podem ser criados por qualquer pessoa em plataformas também gratuitas, como o Blogger, Wordpress ou Tumblr, e geralmente seus conteúdos se baseiam em resenhas, curiosidades e notícias acerca do mundo dos livros, podendo também incluir filmes, séries, ou outros nichos de interesse de seu escritor.

Muitos leitores acompanham esses blogs pessoais com o objetivo de descobrir novas leituras e também interagir com leitores de diferentes partes do mundo, trocando ideias e opiniões. Como os de mais sucesso são em sua maioria administrados por jovens que de alguma forma representam uma influência na rede - também chamados de digital influencers -, as editoras grandes têm apostado nesses blogs para divulgar seus lançamentos, enviando exemplares com exclusividade para que sejam resenhados.
“Eu acompanho vários blogs de livros”, conta Lívia. “Acho extremamente importante na formação de novos leitores, já que os jovens se comunicam e se informam pela internet.” Ela aponta ainda que a influência desses blogueiros e booktubers - que falam sobre livros através de vídeos no site YouTube - desmistificam a leitura como algo apenas para pessoas eruditas, aumentando o leque de opções para todos os gostos. “Talvez, para algumas pessoas, entrar em uma livraria ou biblioteca para procurar o que ler não seja interessante o suficiente para encontrar o que gosta.”
A estudante de jornalismo Júlia Coelho Machado, 21 anos, explica que a ideia de criar um blog surgiu como ferramenta auxiliar para sua terapia, uma vez que, para ela, a leitura permite esvaziar a mente ao passo que promove viagens imaginárias. "Eu consigo viajar através de vários mundos sentada no meu quarto, e eu gosto porque às vezes a gente vive tão estressado no mundo real que precisamos disso", afirma.
Atualmente, as redes sociais como Instagram e Facebook também são grandes auxiliares dos blogs, por expandirem o conteúdo para uma plataforma que engloba muito mais pessoas, e que assim, pode atingi-las mais facilmente. Júlia explica que tem muita respostas ao que escreve através dessas plataformas.
As postagens, que precisam ter uma certa regularidade, acabam exigindo um compromisso com a leitura. "Eu faço uma resenha por semana e tento ler em média 100 páginas por dia, de acordo com as tarefas da faculdade." Ainda segundo a blogueira, as obras selecionadas levam em consideração as preferências de quem acompanha o blog. "Às vezes eu escolho por gosto meu, mas agora comecei a fazer enquetes para que as pessoas escolham o que vou ler depois, e faço um diário de leitura contando o que eu li a cada dia."
Sobre a questão da literatura clássica, ela acredita que tem sim espaço na era digital, e que muitos internautas apostam nesse tipo de obra, garantindo a continuidade de seu sucesso. "É algo que parece perdido, mas que na verdade está ali e não envelhece."
Com os jovens da nova geração, o gosto pelos livros físicos pode ser mais difícil de se desenvolver. A professora de língua portuguesa Aline Azevedo observa que, para alunos de ensino fundamental, a tecnologia ainda supera a literatura, mas isso não quer dizer que o interesse pela leitura se perdeu. "Penso que existem formas positivas de unir as duas coisas. Basta que se consiga motivar os alunos a lerem nos meios digitais."
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